Molière 1622-2022
- Fabio Monteiro
- 1. Mai 2022
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França 2022
O mundo artístico em geral e os franceses em particular festejam o quarto centenário do nascimento de Jean-Baptiste Poquelin, mais conhecido como Molière (1622-1673), um dramaturgo famoso pelas suas comédias. Não se entrará aqui na discussão absurda dos que procuram compará-lo com Shakespeare, seu colega imortal inglês 60 anos mais velho, que também foi excelente nas tragédias (Ricardo III, Rei Lear, Othello só pra citar três) e na poesia. Nem seria o caso de posicioná-lo entre seus contemporâneos franceses Corneille e Racine; isso já foi fartamente estudado.

França 1973 (FDC)
Minha intenção é ressaltar a atualidade e a universalidade de Molière. Suas comédias estão com frequência situadas nos salões da elite parisiense para serem apreciadas por este público. Mas as peças mostram tudo o que essa elite tem de mais desprezível e ridículo, para fazê-la rir de sua própria imagem, enquanto o autor segura o espelho.

França 1944 – Monaco 2022
No Avarento (L’Avare, 1668) temos a caricatura de um novo-rico, tão pão-duro quanto ignorante, que se sente ameaçado pelo furor consumista de seus filhos e pela sociedade, que supostamente anda atrás do seu dinheiro. No Burguês Fidalgo (Le Bourgeois Gentilhomme, 1670) apresenta-se outro pobre rico atormentado pela obsessão por reconhecimento social. Na Escola de Mulheres (L’École des Femmes, 1662) encontramos um “macho raiz” empenhado em manter sua noiva o mais inculta possível, para minimizar o risco de ser eventualmente traído por ela.
Mas meu favorito é Tartufo (Le Tartuffe, 1664): a história de um impostor hipócrita que, valendo-se da incapacidade, da cegueira e da carolice à sua volta, galga os degraus da sociedade, da riqueza e do poder. Até que, ao final, é desmascarado.

O Tartufo ocasionou um escândalo tremendo quando da sua estreia, Molière reescreveu a peça pelo menos duas vezes, mas não conseguiu aplacar a ira da igreja e da ala mais conservadora da corte parisiense. Ao morrer como ator, dois padres se recusaram a dar-lhe a extrema-unção, e a igreja católica não quis enterrá-lo num cemitério cristão. Depois de muitas voltas, concordou-se finalmente num enterro durante a noite, sem público nem pompa religiosa.
Qualquer semelhança a uma sociedade atual dessas seria mera coincidência?
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